Hoje
lembrei de você, foi tão doce e afável. Não consigo entender
porque não lembro todos os dias. Talvez seja como meu amigo Álvaro
de Campos disse: “Depois da angústia e da surpresa da vinda, do
mistério e da falta da tua vida falada, a conversa aligeira-se
quotidianamente, e a vida de todos os dias retoma o seu dia...”
princípio da morte da tua memória! Lembramos nos aniversários,
quando faz anos que nasceste, quando faz anos que morreste. Talvez
seja por isso que lembrei de você hoje, seriam 48 anos. Não que
isso fuja do comum, ou do esperado. Aquilo que faz do senhor mais
vivo, seus escritos, já nos anunciava: “Um dia tudo que viveu e
passou por esta terra irá se perder e tornar pó”. Desde os livros
que escreveu, ou dos que leu, das fotos que tirou, da vida que viveu
ou até o que lhe foi emprestado, teu corpo.
Mas,
apesar de normal ainda me assusta. A saudade é companheira, é
nostálgica. É como uma primavera sem flores, um verão com tristes
canções. O esquecimento é vazio, um abismo que nem voz nem olho
atravessam. Ah! Louca agonia do esquecimento, que nos faz lembrar
doidamente o que esquecemos...
Mas hoje
lembrei de você. Por momentos fiquei triste, mas lembrei-me. Sentado
na beira da cama, vendo fitas antigas de tempos que eu nem existia.
Nas igrejas, nas viagens, nos restaurantes. Fazia tempo que não
ouvia sua voz. Tempos que não ouvia seu sorriso, tão marcante
sorriso! Tantas coisas aconteceram desde a ultima vez que nos
encontramos, e aquilo que mais mexia comigo, principalmente das
tantas despedidas que a vida anda agora me obrigando a fazer, eu
corria pro meu computador e escrevia como se tivesse tendo as velhas
conversas com você, como fiz logo no início. Mas deixei elas
quietas, esquecidas em uma pasta guardada em algum dispositivo de
armazenamento. E hoje lembrei também delas e de que por mais
“terapêutico” que isso pareça, nesta vida não vou mais ter
essa intimidade interrompida tão cedo.
Mas, um
sorriso singelo e nostálgico grudou em mim. Lembrei de como nos
tornamos amigos, de como era bom ter você aqui por perto. Fiquei
feliz pelas lembranças porque elas me trouxeram a recordação dos
tempos felizes que tivemos, lembranças de tempos e de outros tempos.
Lembrei que mesmo tendo partido temos a promessa de um reencontro,
eterno por acaso! Lembrei dos abraços nos teus braços, dos
conselhos dados, da contagiante alegria. Lembrei das palavras
cantadas, ainda que como o Marguidiel disse cantar fosse um “doce
desastre” na sua vida. Lembrei das palavras proferidas, palavras
que saiam dos seus lábios e no vento achavam nosso terno encontro.
Vento... que insiste em passar e levar as lembranças dos meus
pensamentos mas hoje lembrei de você.
E quando
o esquecimento me lembrar e a saudade voltar, vou como uma criança
brincar com seu retrato que achei escondido no meu coração. Afinal
a lembrança pode me faltar, mas grande parte do que sou e do que
creio faz o senhor ainda significar muito, mesmo que eu não lembre.
Mateus
André,
Esquecido,
mas com muitas saudades!